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Alto Tietê

Quatro escolas do Alto Tietê serão cívico-militares no 2º semestre; o que esperar da mudança?

Em todo o estado, serão 100 escolas a adotar o modelo a partir de agosto, mas novidade divide opiniões entre pais de alunos da região

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Em São Paulo, serão 100 escolas a aderir o modelo ao todo | Gilson Abreu/AEN

Reportagem de: Fabricio Mello

No dia 29 de abril deste ano, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) anunciou o resultado do Programa das Escolas Cívico-Militar (ECM). De acordo com o que foi publicado na edição do Diário Oficial do Estado daquele dia, 100 escolas estaduais passarão a adotar o modelo a partir do segundo semestre de 2025 e, entre elas, quatro são na região do Alto Tietê: Euryclides de Jesus Zerbini e Frei Thimoteo Van Den Broeck, em Mogi das Cruzes; Amalia Maria dos Santos, em Itaquaquecetuba; e Professora Landia Santos Batista, em Ferraz de Vasconcelos.

Zerbini, no Jardim Margarida, foi uma das unidades escolhidas para mudar para o novo modelo | Reprodução/Google Maps

O resultado veio a público depois de três rodadas de consultas públicas, iniciadas em março. Segundo o que foi divulgado pelo Seduc-SP, 302 comunidades escolares manifestaram o interesse no modelo em 2024 e participaram do processo. Durante as consultas, puderam votar os pais ou responsáveis pelos alunos menores de 16 anos, estudantes a partir de 16 anos, professores e outros profissionais da equipe escolar.

Com a adoção do modelo pelas unidades selecionadas, a expectativa da Seduc-SP é acompanhar detalhadamente a implantação e avaliar a possibilidade de uma ampliação nos próximos anos.

Como funciona?

Apesar de terem um modelo diferente das unidades regulares, a Seduc-SP afirma que as escolas cívico-militares seguirão o Currículo Paulista e, além disso, que cuidará do processo de seleção dos monitores e de formação de professores das unidades.

A diferença fica no chamado “apoio” que a Secretaria de Segurança Pública (SSP) prestará à Seduc-SP. À SSP caberá, por exemplo, o processo seletivo e a emissão de declarações sobre o comportamento e processos criminais ou administrativos, concluídos ou não, em que os candidatos a atuar como monitores nessas unidades de ensino possam estar envolvidos.

A SSP também vai participar do desenvolvimento de atividades extracurriculares na modalidade cívico-militares, organização e segurança escolar. O processo seletivo dos policiais da reserva – que, segundo o informado até o momento, será um por escola – caberá à Educação e deverá ter início após as consultas públicas.

Em relação ao investimento nas escolas cívico-militares, a Seduc-SP informou que ele será o mesmo já previsto nas unidades regulares. O gasto com a contratação dos monitores, já considerando a expectativa de 100 escolas cívico-militares, é de R$ 7,2 milhões.

Celebrando a mudança

Entre os pais com filhos matriculados nas quatro escolas que serão atendidas pela adoção do modelo cívico-militar no Alto Tietê está André Furlã, pai de Heloisa, uma aluna matriculada na E.E Zerbini, e que vê a novidade como algo “sensacional, em especial pelas possibilidades que o modelo vai estar proporcionando para os alunos“.

Ao O Diário, ele contou que chegou a pesquisar sobre o tema antes de opinar na consulta pública sobre o modelo cívico-militar. “Eu já vinha acompanhando o modelo que tem em Brasília, da primeira escola cívico-militar, e fui um grande apoiador dessa mudança”, relembra.

André e Heloisa durante a conclusão de um ano letivo da estudante | Reprodução/Arquivo pessoal

Dentro da comunidade da escola, uma das figuras fundamentais para a mudança para o cívico-militar, segundo André, foi a diretora da unidade. Ele conta que ela organizou diversas reuniões, em horários alternativos, para explicar como o processo funcionaria, sanar dúvidas e apresentar o modelo para os pais. “Ela criou um grupo e montou um perfil na rede social para a gente [os pais] estar acompanhando. Ela fez essa campanha, conversou com todos os pais e até visitou os bairros da divisa“, conta.

Com o encerramento do período de consulta, André conta que o resultado veio como uma notícia positiva. “Eu não acreditava que a gente ia conseguir, até por estar ‘disputando’ com Mogi inteira, com São Paulo. Para mim, foi até uma surpresa esse resultado”.

Agora, enquanto os preparativos para o início do segundo semestre já no novo modelo acontecem, o que fica são as expectativas – tanto para a grade pedagógica quanto na grade cívica.

“Eu acredito que essa é uma oportunidade que eles [os estudantes] estão tendo para melhorar a questão da civilidade, da disciplina, do respeito entre eles, os valores. […] Eu acredito muito nesse modelo porque os jovens, principalmente os de periferia, eles não tem uma ‘boa referência’ – e a escola vai estar sendo essa referência, além de cumprir o seu papel com a Educação.”

E, além dele, André diz que outra pessoa que se mostrou favorável ao modelo foi a própria Heloisa, que atualmente cursa o 6º ano do Ensino Fundamental. Ele conta que conversou com ela a respeito, tranquilizando a estudante sobre “falas que não são a realidade” e sobre como será a mudança na escola nos próximos meses.

“Ela é favorável a mudança. Lógico, o adolescente fica meio inseguro, mas a gente teve essa preocupação de estar explicando que não vai ser aquela coisa militarizada, que o aluno vai ter a sua autonomia, vai poder se posicionar”, contou André.

E quem foi contra?

Ao mesmo tempo que há quem celebre a mudança do modelo, há aqueles que vêem nela um problema a ser resolvido. Em entrevista ao O Diário, Heloisa Moreira, que é mãe da Melissa, uma aluna matriculada na E.E. Frei Thimóteo, disse que se sente “extremamente desconfortável” com a ideia do modelo cívico-militar sendo adotado na unidade.

Meus pais estudaram nessa escola, eu estudei também quando era criança e, agora, é a escola em que a minha filha estuda“, relembra Heloisa, ao falar sobre a sua relação com a unidade. Ainda segundo ela, a mudança para o cívico-militar não atenderá às necessidades pedagógicas da escola.

Melissa e Heloisa durante uma atividade da escola | Reprodução/Arquivo pessoal

“Não existem evidencias sobre a eficácia da militarização, não há dados sobre a melhora pedagógica, e não há preparo dos militares e acolhimento às diversidades – aparentemente melhora a disciplina, mas na verdade, reprime as manifestações com uso de violência, ameaças, o que pode piorar muito o aprendizado das crianças”, conta.

Para ela, que é psicóloga escolar e atua na área da Educação, o necessário era a formação de uma “equipe bem preparada” para lidar com as demandas da comunidade.

Além da visão sobre o modelo, Heloisa também relata uma outra versão sobre o processo de consulta pública que resultou na adoção do modelo cívico-militar pela unidade onde a sua filha estuda. Nas palavras dela, a escola “não foi nada didática, muito menos imparcial no processo de votação”. Ela critica, ainda, a falta de divulgação que o trâmite teve dentro da comunidade da E.E. Frei Thimóteo.

“Houve um momento, no ano passado, para discutir o tema – que não foi bem divulgado. Postaram no Instagram que haveria uma reunião de pais, eu não pude ir devido ao meu trabalho e a má divulgação, mas minha mãe compareceu e a reunião foi tipo ‘você quer mais segurança na escola do seu filho? sim ou claro?'”, relata.

Após essa etapa, a votação online foi realizada e resultou no cenário atual da unidade, sendo ela uma das duas contempladas pelo modelo cívico-militar em Mogi das Cruzes.

“Infelizmente, a maioria dos pais da escola não tiveram o acesso à informação da forma que deveriam, não sabem como funcionará, de fato, a escola. Não sabem que militares aposentados darão aulas e nem como é feita a exigência de disciplina nos alunos, que é por meio de ameaça”, lamenta Heloisa. “Isso reforça a desvalorização de docentes em escolas tradicionais. Por que um professor de uma escola tradicional tem que ganhar menos que um professor militar?”

Com a iminente adoção do novo modelo, a opção que sobra é tentar a transferência de sua filha para uma outra escola na cidade. Ela relata, ainda, que já chegou a conversar com sua filha, de 12 anos de idade, sobre a possibilidade da mudança, mas que está aguardando o momento certo para dar a notícia.

“Eu expliquei o que pude a ela. […] Como ela gosta muito da escola, ela ficou triste na época mas entendeu. Agora que de fato vai acontecer, eu estou esperando conseguir a transferência para falar pra ela, mas ‘tô’ preocupada porque sei que ela vai ficar triste”, desabafa.