Entrada dos Palmitos volta após três anos, com novidades
Com meta de superar números de cavaleiros e devotos, a Festa do Divino de 2023 voltará a colocar nas ruas a Entrada dos Palmitos. O cortejo promete ter 420 cavalos e charretes, superando os 290 participantes do último da série feito com pompa e circunstância há distantes três anos. Deverá ser maior em tudo, em […]
Reportagem de: O Diário
Com meta de superar números de cavaleiros e devotos, a Festa do Divino de 2023 voltará a colocar nas ruas a Entrada dos Palmitos. O cortejo promete ter 420 cavalos e charretes, superando os 290 participantes do último da série feito com pompa e circunstância há distantes três anos.
Deverá ser maior em tudo, em público, em pratos de afogado compartilhados pelo povo após a caminhada, e no número de carros de boi. Voltam a quermesse, a folia, o Congado, o afogadão. O hiato deixou marcas. Impulsionadas pela pandemia, a violência e a desidratação da vida rural, serão notadas fraturas culturais novas e antigas desta manifestação única no calendário regional e brasileiro que soma dois séculos de realização pelos mogianos. A Festa do Divino tem o dobro dessa idade.
Não estarão à disposição das crianças que disputam um cantinho dentro dos carros de bois, os carreiros de cidades-satélites de Mogi das Cruzes.
A maioria das peças desse secular meio de transporte virão da mineira Cambuí, contratados para o desfile do sábado penúltimo do evento.
A importação dos carreiros e carroças vem de tempos, mas ainda se pôde contar até 2019 com exemplares de propriedades rurais de Salesópolis e Santa Branca. Neste ano, que celebra a volta do cortejo caipira, com devotos, cavalos, charretes e outros símbolos do passado mogiano, a frota será mesmo estrangeira.
Nestas duas cidades vizinhas, os donos dos carros e dos bois conhecidos do professor de história e responsável pela Entrada dos Palmitos, Glauco Ricciele foram vencidos por uma onda de roubo e furtos assustadora e recente. “Nestas cidades, as pessoas com quem ainda mantínhamos contato, não possuem mais os bois. Desistiram por causa de uma onda de violência. Pessoas armadas chegavam nas fazendas, levavam os bois de caminhões, na tranquilidade”, apontou o coordenador.
De Mogi
Pelo o que sabe Ricciele, apenas dois carros e, ainda assim, sem os bois, são da própria cidade. Um é da família da rezadeira e devota Albertina Maria Ferreira [1943-2019], que possui terras no alto da Serra do Itapeti, nas proximidades da Cruz do Século. O segundo foi comprado pela Associação Pró-Festa. Para colocá-los no cortejo, os organizadores terão de trazer os animais de fora.
Sem os carros de bois da vizinhança, a saída foi contratar os que resistem em Cambuí, cidade que desde meados de 2010 se mobilizou para preservar essa cultura e mantém uma Associação Municipal de Carreiros. “Essa cultura está se perdendo não só em Mogi das Cruzes, mas no Estado de São Paulo. Antes da pandemia, coordenei a formação da Associação Paulista do Carro de Boi, com a intenção de criar uma escola para a formação dos carreiros. Já havia 40 pessoas de diferentes cidades articuladas para isso. O problema foi a pandemia, mas ainda queremos retomar essa cultura em São Paulo”, descreve o professor, que esteve na fundação da Academia Mogicruzense de História, Artes e Letras, a Amahal.
Bom-trato
Além de contratar os carros de boi de Cambuí, a organização da Festa do Divino promete que serão atendidas normas legais para garantir que os animais não sofram de maus-tratos durante a estadia na cidade e o cortejo, em si.
Segundo Ricciele, será mantido um veterinário para acompanhar todas essas etapas. O mesmo valerá e será exigido dos cavaleiros e dos charreteiros que participarem dessa expressão popular, trazida pelos portugueses para o Brasil, e associada a costumes e modos de viver no país e na cidade. A Entrada dos Palmitos, além de lustrar a devoção do povo no Divino Espírito Santo, lembra as antigas festas, quando o povo que residia nos miúdos da Serra do Itapeti vinha, em cortejo, com balaios carregados de alimentos e outros produtos para a cidade – onde permanecia durante todos os dias da Festa do Divino.
O historiador acresce a importância de se proteger esse registro – em específico, dos carros de boi com seus charmes como o som das rodas de madeira, a presença dos animais e dos condutores. “Há um simbolismo histórico que a Festa do Divino quer preservar. Inclusive, no sentido do sincretismo porque esses animais eram considerados sagrados, num determinado tempo da história da humanidade, e depois foram usados como meio de transporte”, comenta.
Sem álcool
A partir dos próximos dias, serão divulgados como os cavaleiros e donos de charrete devem se inscrever para participar da Entrada dos Palmitos. Regras serão exigidas como a eliminação da bebida alcóolica no trajeto.
Outra novidade na Entrada Palmitos, suspensa por causa da pandemia, será a presença de representantes de escolas e de grupos ligados às paróquias mogianas. “Pretendemos fazer uma festa maior para marcar o retorno da quermesse e do público”, lembrou Glauco.
Gabriel Sater e Demônios da Garoa são esperados
A menos de um mês da Festa do Divino Espírito Santo, devotos começaram a preparar os primeiros tachos de doce que serão vendidos na quermesse, instituição folclórica e popular que será realizada após três anos.
O recesso está sendo contado como um fator que deverá atrair mais pessoas ao CIP Deputado Mauricio Najar, no Mogilar, onde as barraquinhas de comes, bebes e outros atrativos funcionarão de 18 a 28 de maio.
A Festa do Divino espera 400 mil participantes, na agenda chancelada como a maior da cidade e do Alto Tietê em público e poderio turístico, cultural e religioso.
Ela está nas mãos da Diocese de Mogi das Cruzes, porém, é realizada por voluntários e a Associação Pró-Festa do Divino, a quem cabe administrar uma “empresa” temporária. Apenas com a organização da Entrada dos Palmitos, que terá de contratar itens como os carros de bois para o cortejo, gradil e veterinário, deverão ser gastos cerca de R$ 120 mil.
A estrutura como um todo, que responde pela quermesse e as alvoradas, costuma movimentar mais de R$ 1 milhão – um dinheiro que, feitas as contas ao final, é dividido entre a Igreja Católica e 27 entidades participantes.
Para esses parceiros, associações beneficentes, a volta da quermesse fura uma bolha marcada pela redução dos recursos financeiros que ajudam a bancar o atendimento a crianças, jovens, adultos e idosos carentes.
Data fechada
A festa deste ano celebra 410 anos, segundo registros obtidos por pesquisas e estudiosos e ex-festeiros.
São anunciadas atrações como os cantores Agnaldo Rayol, Gabriel Sater, Demônios da Garoa, padre Antônio Maria e Orquestra de Mogi.
Respondem pela condução da festa, os festeiros Josmar Cassola Silva e Maria Tereza Pereira Cassola Silva, e os capitães de mastro Ricardo Medina Alvarez e Maria de Lourdes Pereira da Silva Medina.
Congado terá convidados
O congado de Mogi das Cruzes passou a ser representado por 7 grupos de congado e moçambique. Eram 8, até a festa de 2019. Os anos de privação do contato e do ficar em casa para o coronavírus não matar ainda mais, se somaram à troca no comando nos territórios de rezas e danças a santos pretos, como São Benedito e Santa Ifigênia, localizados em bairros como César de Souza e Braz Cubas. O moçambique da Santa Cruz, de César de Souza, não está mais atuante, avisa Glauco Ricciele, que organiza a Entrada dos Palmitos.
Os 7 grupos são esperados no cortejo, e a Festa está buscando gente de fora, como um grupo de folia de Salesópolis. A perda do protagonismo local, envelopada pela expansão urbana e que está na causa, por exemplo, do desaparecimento do uso do carro do boi, é lamentada por Ricciele.
Porém, ele afirma que os festeiros buscam os grupos de longe para recriar capítulos do louvor sagrado e profano. “Não podemos deixar ser página de livro”, diz, defendendo a manutenção do programa religioso e cultural para legar às gerações mais novas uma história que passou de pai para filho até chegar a ser um patrimônio quatrocentão.