Elias Martins: ‘Desejo de mudar define eleição’
A mudança de comportamento da população mogiana, que poderia ter sido mensurada por uma leitura sociológica do atual momento na cidade, foi decisiva no resultado das eleições do último domingo, que deu vitória ao candidato Caio Cunha (PODE) e, pela primeira vez, terminou com um prefeito não reeleito no município. A avaliação é do cientista […]
Reportagem de: O Diário
A mudança de comportamento da população mogiana, que poderia ter sido mensurada por uma leitura sociológica do atual momento na cidade, foi decisiva no resultado das eleições do último domingo, que deu vitória ao candidato Caio Cunha (PODE) e, pela primeira vez, terminou com um prefeito não reeleito no município. A avaliação é do cientista político Elias Martins Pereira, sócio-proprietário e diretor do Instituto de Pesquisa e Marketing Paulista e Informação (Ipempi). Ele conta que a uma semana do 2º turno, 56,3% dos entrevistados nos dias 20 e 21 de outubro queriam mudança e renovação, com 44,3% das intenções de votos para Caio e 27% para Melo.
O que as pesquisas pré-leitorais mostravam em Mogi?
No primeiro turno, nossa pesquisa mostrava que haveria o segundo turno em Mogi, que seria disputado entre os candidatos Marcus Melo e Caio Cunha, e já apontava um número grande abstenções. Quando se faz um plano de amostragem é preciso expandi-lo e tentar descobrir onde estão os problemas. No segundo turno, havia um movimento pelo novo e na nossa pesquisa, o Caio estava 17 pontos na frente. Isso vinha desde os dias 20 e 21 e não mudou até o dia das eleições. Então, o episódio do narguilé, no dia 22, não teve interferência, como se pensa. O eleitor estava mesmo em busca de promover uma mudança e o Caio se encaixou nesta mudança.
Em que a campanha do candidato à reeleição Marcus Melo teria falhado?
O governo e a equipe de campanha não perceberam os sinais de mudança no comportamento da população em geral, não apenas dos eleitores, sobre as demandas que a administração deveria atender na cidade. E quando a administração se comunicou durante a campanha, fez isso mal, porque não conseguiu passar o que fez de bom e ficou se justificando dos ataques dos adversários. Esta leitura sociológica do momento político do Marcus Melo foi muito ruim. Ele tinha que ter mostrado o ponto mais forte do governo, que era a saúde, mas quando mostrava, não mostrava bem. O adversário não entrava no tema saúde com muita dureza porque sabe que a estrutura e o sistema de saúde de Mogi funcionam bem. Então, este era um peixe que o atual prefeito tinha para vender. Mas faltou esta leitura sociológica do processo em curso, que gerou a facilidade da população encontrar no Caio a possibilidade de um projeto de mudança. Esta leitura poderia ter ser apurada em pesquisa feita por profissional capaz de interpretar a mudança. O modelo tradicional de campanha, do político discurseiro, já está superado. As pessoas não querem mais ver isso.
O que elas querem?
Elas querem que os candidatos falem, sejam claros, que mostrem o que foi feito e propostas do que pretendem fazer. A conversa do passado não vira mais. Na política, o farol é aceso para a frente, não para a trás. Toda a estrutura, a máquina do governo, o apoio dos ex-prefeitos, um deles deputado federal… Nada disso adiantou. Ele colocou todo mundo na roda para falar de passado, quando na verdade, os recursos da administração são do presente. Não adiantou, porque quem muda não são os políticos, mas sim os eleitores. E era preciso entender o que estava acontecendo em todos os prontos da cidade, na periferia, nos extremos, na zona rural e, sobretudo, na classe média, que sempre foi muito forte em votar em candidatos que estão instalados na administração e desta vez sentiu que havia necessidade de mudar.
O pefil do eleitor mogiano mudou?
A cidade mudou, veio muita gente de fora e o povo não percebeu. Pensam que a população é a mesma da década de 1970. Tem muita gente aqui que não conhecemos. Para estas pessoas não interessam o sobrenome dos políticos e a história. Querem saber das necessidades reais que elas têm. A pandemia gerou sérios problemas de origem social, como o grande aumento do desemprego, falta de oportunidades para que estas pessoas consigam emprego na cidade, então, de certa forma, deixou todos os governos iguais, afetou todo mundo, não apenas aqui. Tanto é que o índice de reeleição foi alto, maior do que a derrota de quem estava na administração. Em Mogi, esta foi a primeira vez, historicamente, que um candidato à reeleição é derrotado. Mas tudo depende do desempenho de cada um. Há lideranças que podem se recuperar e outras não, porque o novo sempre vem.
O fato de Caio Cunha ser um candidato jovem influenciou no resultado?
O fator jovem influenciou no sentido da linguagem porque ele falou diretamente com o público das redes sociais. Mas é preciso sempre lembrar que isso vem associado ao desejo de mudança e ao desgaste de um longo período do governo que havia na cidade.
A vice-prefeita Priscila Yamagami pode ter atraído o eleitorado por ser mulher?
Serviu como um momento importante para o Caio dialogar com as mulheres dizendo que tem uma mulher em seu governo e que ela tem presença importante, porque será a vice-prefeita mulher que Mogi nunca teve. Em uma sociedade machista e conservadora como a da cidade, e diante dos avanços do papel da mulher no governo, isso pegou bem e foi uma vantagem para ele. Mas o papel dela tem que ser reconhecido, porque só tem importância se houver representatividade de fato e abraçar causas.
Como este sentimento de esperança deve se sustentar durante o novo governo?
Ele vai precisar de tempo. Não se faz isso de maneira abrupta porque depende muito da organização que ele tiver, da equipe que organizar para trabalhar, e a própria administração precisará de tempo. Porém, a Prefeitura também não é lugar para aprender e sim para fazer. Não dá para ficar quatro anos aprendendo. O eleitor não quer saber do discurso do passado, de coronel. Ele quer resultado, que a cidade dê continuidade aos bons serviços que já tem, como a saúde, por exemplo, mas entende que é preciso agilizar esta estrutura para melhorar.
Há mais demandas?
Os jovens mogianos que moram em bairros mais distantes do centro querem espaços de lazer e convivência. A escola é lugar de aprendizado, não de lazer. Faltam centros e estrutura culturaal nos bairros, espaço para as mais diversas expressões de arte. Isso é uma necessidade não apenas dos jovens, como também dos mais velhos, que necessitam muito de espaços de lazer e cultura. O Sesc que será instalado ficará no centro da cidade e será direcionado à atividade de um público restrito, pessoas do centro e até que vêm de fora, mas ainda não atende quem está na periferia.
Esta esperança de mudança se consolidou nas eleições de Mogi, mas não ocorreu o mesmo com o candidato Guilherme Boulos na cidade de São Paulo. Por quê?
São histórias diferentes. O Boulos teve uma votação surpreendente e bom desempenho. Não dá para comparar Boulos com Mogi. Em São Paulo são quase 9 milhões de eleitores e a agenda é outra agenda. O sentimento de mudança só existe quando a administração não atende as demandas da população. Ele não vem do nada, mas sim por um motivo real e concreto. Então, as pessoas vão buscar outras alternativas de governo. Isso é mais concreto do que subjetivo.
Elias Martins Pereira
Nascido na Capital Paulista, Elias Martins Pereira, 64 anos, mora em Mogi das Cruzes há duas décadas. É formado em História e Ciências Sociais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp), lecionou 16 anos no Instituto de Educação Dr. Washington Luís e 18 anos na Universidade Braz Cubas (hoje Centro Universitário Braz Cubas). Durante 15 anos, trabalhou na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Também atuou na área de consultoria de Gestão Pública nas prefeituras de Suzano, Itaquaquecetuba e Mauá. É sócio-proprietário e diretor do Instituto de Pesquisa e Marketing Paulista e Informação (Ipempi).