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A gente paga e não leva; receitas do pedágio em Mogi beneficiarão o litoral

Novos levantamentos realizados por O Diário, com a ajuda de técnicos e especialistas, mostram que a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) e o governo estadual querem instalar uma praça de pedágio na rodovia Mogi-Dutra somente para que os recursos ali arrecadados venham a custear a maior parte das obras destinadas a […]

24 de julho de 2021

Reportagem de: O Diário

Novos levantamentos realizados por O Diário, com a ajuda de técnicos e especialistas, mostram que a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) e o governo estadual querem instalar uma praça de pedágio na rodovia Mogi-Dutra somente para que os recursos ali arrecadados venham a custear a maior parte das obras destinadas a estradas da Baixada Santista, no projeto de concessão Lote Litoral Paulista, já com licitação internacional aberta.

LEIA TAMBÉM: Lideranças da cidade renovam disposição para lutar contra o pedágio na Mogi Dutra

No sábado passado, este jornal mostrou que a arrecadação prevista para a praça de cobrança de Mogi das Cruzes corresponderá a 33,2% de tudo que vier a ser recebido nos cinco pedágios a serem instalados nas rodovias abrangidas pela concessão. No entanto, somente 8% dos investimentos, algo em torno de R$ 55,5 milhões deverão ser destinados à rodovia Mogi-Dutra. E o pior: desse total, R$ 18,6 milhões estão destinados à construção da praça do pedágio, ficando outros R$ 37 milhões para obras no trecho de oito quilômetros daquela rodovia.

A maior parte dos investimentos ficará mesmo para a rodovia Padre Manoel da Nóbrega (SP-55), que corta as cidades de Cubatão, São Vicente, Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe. Para lá estão programados 69% dos recursos do programa, algo em torno de R$ 506 milhões.

“Esses números demonstram claramente que o pedágio na Mogi-Dutra só foi colocado no projeto para custear as obras que terão de ser feitas na Baixada Santista. Isso prova que não faz sentido a existência de um pedágio em nossa cidade para bancar os custos de obras em outros municípios”, afirma o prefeito Caio Cunha (PODE), que ainda ironiza os custos da praça do pedágio: “As cabines devem ser de ouro, afinal, que obra tão grandiosa é essa para custar mais de R$ 18 milhões?”

Segundo informações obtidas por O Diário junto à Artesp, dos cerca de R$ 3 bilhões a ser investidos durante os 30 anos na concessão do Lote Litoral Paulista, mais de R$ 1 bilhão será aportado em intervenções de engenharia na rodovia Padre Manoel da Nóbrega, “para maior segurança e fluidez das vias, além de maior conforto aos usuários”.

Entre as intervenções já programadas está a duplicação do trecho Miracatu-Peruíbe, “gerando continuidade de pista dupla da serra até o acesso ao porto de Santos e o litoral”.

Também será duplicado o trecho Bertioga-Santos, que os moradores da região conhecem como “gargalo”.
Resumindo, somente para a SP-55, a Padre Manoel da Nóbrega/Rio-Santos, estão previstos 81 km de duplicação, 19 novas passarelas com adequação de outras 26, e mais 27 dispositivos de retorno, que incluem viadutos e passagens subterrâneas.

O pacote prevê ainda duplicação de sete pontes ou viadutos e recuperação ou alargamento de outros quatro.
Além disso, serão implantados, melhorados ou pavimentados 6 km de vias marginais e ainda colocados 137 pontos de ônibus. Somente de ciclovias serão 72 km. A estrada terá ainda passagens de fauna em diversos pontos.
E para fiscalizar tudo isso, deverão ser construídas cinco bases operacionais para a Polícia. Estão previstas também  praças de pedágios em três pontos da rodovia, a principal delas na região de Itanhaém, que responderá pela maior arrecadação de todas as praças (42%), o equivalente a R$ 5,2 milhões, contra os 33% da Mogi-Dutra, correspondentes a R$ 4,1 milhões, uma diferença bastante reduzida, com um detalhe: o valor do pedágio na Baixada será maior que o cobrado em Mogi.

Levantamento feito por técnicos consultados por este jornal, baseados em estudos da Artesp, considerando-se apenas os investimentos nas respectivas rodovias, indica que a Padre Mnoel da Nóbrega/Rio Santos, receberá investimentos de R$ 506 milhões e conseguirá uma receita de R$ 7,4 bilhões, enquanto a Mogi-Dutra ganhará investimentos de cerca de R$ 58 milhões e deverá produzir uma receita de R$ 4,1 bilhões. Já na Mogi-Bertioga deverão ser investidos R$ 99,4 milhões com a expectativa de arrecadação de cerca de R$ 840 milhões.

A previsão de arrecadação corresponde ao período de duração da concessão, inicialmente estabelecido pelo prazo de 30 anos, segundo consta do edital internacional divulgado pela Artesp, no início deste ano.

“É tudo um grande absurdo. Não há do que se falar. Vamos gerar 30% da receita e receber um investimento pífio. Com esse projeto, a cidade nada ganha, a não ser transtornos e a quebra de um planejamento urbano que vem sendo discutido com a sociedade mogiana há mais de uma década. Estou avaliando todo o projeto e ainda não consegui encontrar os benefícios e melhorias a que o vice-governador se referiu”, disse o prefeito Caio Cunha, aproveitando para alfinetar o vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), que durante visita a Ferraz de Vasconcelos, no decorrer desta semana, afirmou que o projeto de concessão e o pedágio irão servir para “melhorar a vida das pessoas” da região abrangida pela obra. O vice Garcia, porém, não citou que melhoria uma praça de pedágio na Mogi-Dutra irá trazer à região do Alto Tietê.

Mogi, cidade dividida

O que uma sequência de sete viadutos e sete passarelas instalados, sem qualquer discussão mais profunda com autoridades e comunidade, ao longo de sete quilômetros de uma única via que corta grande parte do espaço urbano de uma cidade pode significar para o seu futuro?

“Uma loucura”, responde, sem pestanejar, o secretário de Planejamento de Mogi das Cruzes, arquiteto Claudio de Faria Rodrigues, ao analisar o projeto da Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), que poderá transformar a atual avenida Perimetral, no trecho entre a estrada do Pavan e a Mogi-Bertioga, numa via expressa, causando um indesejável seccionamento na cidade. A proposta da Artesp é parte de um programa mais amplo destinado a transferir para a iniciativa privada um lote de rodovias das regiões da Baixada Santista e de Mogi das Cruzes por um período de três décadas. Como contrapartida para um pedágio a ser implantado nos dois sentidos da Mogi-Dutra, o edital prevê a duplicação de 1,4 km da estrada do Pavan e a coleção de viadutos e passarelas, em sequência, sobre parte da avenida Perimetral de Mogi.

“Esta obra é justamente o oposto do que estabelece o Plano Diretor de Mogi, resultado de três anos de intensas discussões com a comunidade de toda a cidade. Este planejamento prevê bairros mais conectados para termos uma cidade mais funcional e unida, mas o plano da Artesp irá promover uma nova divisão no município, deixando de um lado Braz Cubas e Jundiapeba e, de outro, o restante da cidade”, afirma o secretário, lembrando os efeitos urbanísticos danosos do seccionamento causado pela via férrea, responsável por carrear novos investimentos para a parcela da cidade localizada “abaixo da linha”, onde estão Mogilar, Vila Industrial Rodeio, Ponte Grande e parte do distrito de César de Souza.

A proposta do Plano Diretor de uma cidade cada vez mais compacta, com unidade de vizinhança e com maior diversidade no uso do solo, buscando privilegiar cada vez mais o pedestre, está sendo literalmente detonada pelo estudo da Artesp, na visão do arquiteto e secretário.

Claudio não está sozinho nesta avaliação. Concordam com ele os integrantes da Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos de Mogi das Cruzes, responsável por um documento em que esmiúça, ponto por ponto, as falhas da proposta do governo.

“Todos esses viadutos visam favorecer  quem vai para o litoral de Bertioga, pois suas características são voltadas a possibilitar o trânsito rápido no caminho para a praia, e nunca quem mora na cidade”, afirma o presidente, engenheiro Nelson Bettoi Batalha, mostrando que a passagem da chamada Rota do Sol (Perimetral) por cima da avenida Japão é um exemplo claro disso. O viaduto só favorece quem está indo ou voltando da praia, não tendo conexões para quem precisa se dirigir a algum outro ponto daquela região da cidade. “Esse plano interfere negativamente em nosso anel viário, a ser completado com a conclusão das interligações entre Mogi-Bertioga com a Mogi-Guararema”, lembra Nelson.

O secretário Claudio de Faria lembra ainda que a transformação da Perimetral em uma via expressa  vai na contramão do trabalho que está sendo feito para fortalecer Braz Cubas e Jundiapeba com a chegada de novos investimentos dos setores público e privado.

“É uma aberração”, sacramenta, lembrando que “enquanto no mundo inteiro as cidades estão cada vez mais voltadas para as pessoas, a obra da Artesp favorece o rodoviarismo”, afirma Claudio, espantado com tal fato haver sido confirmado pelo vice-governador Rodrigo Garcia, durante visita à região. “Quando buscamos planejar uma cidade unindo e facilitando trabalho, lazer e qualidade de vida, vem o Estado e quer construir esse verdadeiro muro de Berlim dividindo Mogi”, diz.

Engenheiros e arquitetos questionam ação da Artesp 

A  Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos de Mogi  produziu um documento onde mostra questões pontuais no projeto da Artesp relacionado com a cidade. A entidade também questiona a instalação de um pedágio na Mogi-Dutra, considerado pelos profissionais como um entrave ao desenvolvimento  do município e região.

Indiferente aos apelos e protestos, Artesp leva adiante a concorrência

Alheia aos protestos de autoridades, entidades, empresas e da comunidade da região do Alto Tietê, a Artesp continua levando adiante a licitação internacional destinada a escolher a empresa ou consórcio a quem espera entregar a administração de rodovias das regiões de Mogi das Cruzes e Baixada Santista. 

Ainda nesta semana, o Diário Oficial do Estado de  São Paulo publicou a Portaria Artesp nº 56, de 21 de julho de 2021, que constitui a Comissão Especial de Licitação para a concorrência internacional nº 002/2021, que tem por objetivo a concessão dos serviços públicos de ampliação, operação, manutenção e realização dos investimentos  necessários para a exploração do sistema rodoviário denominado Lote Litoral Paulista. Entre os integrantes da CEL, estarão Andréa Barbosa Paradela da Gama, representando a Artesp; José Manoel Aguirre Neto, representando a Secretaria de Logística e Transporte; e José Benedito Priori, ligado à Secretaria de Planejamento.

Aos integrantes da Comissão caberá acompanhar todos os passos da licitação e o cumprimento dos prazos estabelecidos em seu cronograma de várias etapas.

Isso mostra que o governo continua pouco se importando com os apelos e outras manifestações da comunidade do Alto Tietê, contrária ao pedágio a ser instalado na Mogi-Dutra, o qual irá afetar a economia e a qualidade de vida de toda a região.

Na visão do prefeito de Mogi, “um plano muito bem arquitetado pelo governo e Artesp, muito antes da audiência pública  que o apresentou à região, em 2019. Desde o começo eles estão irredutíveis e não admitem voltar atrás, pois tudo foi planejado em cima da base financeira do pedágio da Mogi-Dutra,” diz Caio Cunha.

Por isso mesmo, a Justiça e a pressão popular são os meios mais indiscados, segundo ele, para  impedir tal processo que caminha “para os finalmentes”.

Mogi move dois processos para tentar brecar o projeto. Uma ação civil pública  e uma representação junto ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, solicitando um exame prévio do edital de concorrência onde, segundo a ação, existiriam falhas capazes de comprometer a licitação. Ambas ainda esperam por julgamento. 

 

 

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