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Pedrinho Matador, o maior serial killer brasileiro, foi tio amoroso e jardineiro em escola de Mogi

Um almoço de domingo com os irmãos que não se viam há um ano e meio, mas conversavam todos os dias, seria o programa na casa 45 da pacata rua José Francisco Costa, na Ponte Grande, em Mogi das Cruzes, cenário de vídeos comentados por milhares de seguidores do visitante que estava sentado em uma […]

10 de março de 2023

Reportagem de: O Diário

Um almoço de domingo com os irmãos que não se viam há um ano e meio, mas conversavam todos os dias, seria o programa na casa 45 da pacata rua José Francisco Costa, na Ponte Grande, em Mogi das Cruzes, cenário de vídeos comentados por milhares de seguidores do visitante que estava sentado em uma cadeira branca, colocada na calçada, com uma sobrinha no colo. Morreria, em instantes, um dos maiores criminosos brasileiros.  De um Gol, preto, desceram dois homens, um deles com uma máscara do personagem do universo DC, o Coringa; um terceiro ficou no carro. À mãe da menina, disseram: “Não é nada com você”. Ela levou a filha para dentro. O alvo da execução com requinte de crueldade – a vítima foi degolada – havia chegado do litoral santista, na quinta-feira, e era muito conhecida da crônica policial: Pedro Rodrigues Filho, Pedrinho Matador, está no topo da lista de serial killers do Brasil, com o total de 71 vítimas identificadas, e uma soma, não oficial, de mais de 100 assassinatos nas mãos. O corpo tatuado do homem que iria completar 69 anos em outubro deslizou para o chão. Um bandido drenou o sangue com um corte no pescoço, ritual  de imposição de humilhação e vergonha dentro dos presídios brasileiros.

A notícia da morte do criminoso que afirmava ter parado de matar em 2003 teve repique nacional e internacional por se tratar de quem era, um homem temido durante os 42 anos passados em prisões e dono do surpreendente recorte em número e na frieza e crueldade com que praticava os homicídios, a faca, ou com a quebradura do pescoço do escolhido para morrer. Ele matou dos 14 aos 49 anos. Ex-presidiário, se tornou influencer convertido na fé cristão pela igreja evangélica Santidade e Arrependimento, comentava crimes e aconselhador. Isso no público, no privado, as pessoas conheceram o outro lado do serial killer com as visitas à família, o trabalho de jardineiro e caseiro, um período de internação em uma clínica (pertencente à igreja do pastor Julio César dos Santos) e as pregações da Bíblia.

À polícia, testemunhas disseram que o trio assassino desceu  do carro,  mandou retirar a sobrinha da cena do crime, desferiu os tiros e, em  seguida, degolou a vítima. O veículo foi deixado na Estrada Cruz do Século. Eles teriam ido embora em um outro carro, branco.

A vida em Mogi

O Diário conversou com Angela, uma das irmãs de Pedro, que reside em Mogi, cidade onde nasceram os filhos mais novos da família Rodrigues, na Ponte Grande. Com pouco detalhe, ela disse que não via o irmão havia um ano e meio, tempo em que ele permaneceu no litoral santista. 
Ele chegou a Mogi na quinta-feira, três dias antes de morrer. Esteve ativo nas redes sociais (leia, ao lado). O domingo seria um dia de encontro da família. Sem indicar razão para a morte do irmão considerado uma boa pessoa, atenciosa e carinhosa com os seus, a irmã não fala em justiça. Não na dos homens. “Eu acredito que o tempo dele acabou, somos peregrinos nesta vida e eu creio que ele está nas mãos do Senhor”. A família é evangélica.

A proximidade com a cidade se dá porque a família reside há mais de seis décadas na Ponte Grande, onde nasceram os filhos mais novos de Emanuela e Pedro, pais de “Pedrinho”. “Eu sei contar depois de mim. Nasci na Ponte Grande e não posso contar de quem veio antes de mim”, diz Angela, 64 anos.

A família deixou São Gonçalo (MG) para viver em São Paulo. O casal teve 8 filhos, sendo que três faleceram.

As conversas entre os irmãos eram diárias, com o ‘bom dia’, a troca de receitas de chás e remédios para determinado mal-estar. 
Pedro era solteiro e, segundo ela, não teve filhos. Foi tio amoroso com os sobrinhos, a quem dava conselhos.

“Eu e todos nós não sabemos o que aconteceu, ainda estamos sem entender tudo isso”, disse, finalizando a conversa.

Personagem para filme

Pedro começou a matar aos 14 anos, quando vingou uma acusação considerada injusta contra o pai, que trabalhava com o vice-prefeito de Alfenas (MG). A autoridade foi vítima inicial do homicida, considerado psicopata por equipe médica. Logo após,  matou um vigia que teria sido o autor do roubo creditado ao pai. O pai morreu na cadeia e foi acusado de ter matado uma companheira com 21 facadas. 

Há contradições sobre o que Pedro sempre sustentou: um parricídio, a autoria da morte do pai na cadeia (a irmã não quis comentar esse assunto). Ele teria admitido a pessoas próprias que a história não era bem essa.

Outras mortes engrossariam a lista (veja aqui), sobretudo no interior dos presídios, onde a fama de matador se consolidou – ele é considerado um caso raro de sobrevivência no sistema carcerário, algo explicado pela manutenção da imagem de serial killer. No sistema prisional, quem esquarteja e mata, costuma sobreviver  mais  na complexa e violenta sociedade onde os mais fracos, com crimes menores, têm menos chance de sair vivo desse ciclo.

 A Justiça identifica 71 vítimas, mas o criminoso afirmava que haviam sido mais de uma centena. Ele é o primeiro da lista de assassinos em série no Brasil. Passou 42 anos preso, 26 em liberdade. Estava livre de 2018 até o domingo (5) quando morreu, talvez, em uma vingança servida em prato frio e tardio.

Ele foi jardineiro na escola do botujuru e querido por estudantes 

Durante três anos, Pedro Rodrigues Filho trabalhou como jardineiro na EE Francisco de Souza Mello, no Botujuru. Chegou à escola após um pedido feito por uma das irmãs dele, Ângela, à então diretora, Maria Zelinda Rodolfo. 

A conquista do emprego era uma maneira de ressocializar Pedro, num período em que se libertou das grades. Maria Zelinda sabia da história do homem de pouca palavra, tímido, e do apelido de “Matador” que identificava o serial killer brasileiro com o maior número de mortes confirmadas. 
 “Eu pensei muito em como poderíamos fazer. Conversei com ele, falei sobre as regras,  e também falei com a minha equipe e alunos para não ter brincadeiras maldosas, gracinhas, e nem intimidade. Nós sabíamos quem era ele, que estava lá para trabalhar. Foi uma das melhores coisas que eu fiz na minha vida”, define hoje. 

Pedrinho era madrugador e aprendeu o serviço de roça, a caça, a lida com animais, com avós e tios. O nome no diminutivo foi preservado entre os oito irmãos, os mais novos vivendo na Ponte Grande desde o final dos anos 1950. Ele chegava por volta das 5 horas na escola, conhecida pela defesa de causas ambientais e humanas. 

“Trabalhava sábado e domingo, e o chão do jardim era um espelho, não tinha um papel de bala, nada. Teve uma época, que ficava com a chave porque era o primeiro a chegar para cuidar dos canteiros e flores”, lembra a diretora que deixou a unidade em 2021.  
Maria Zelinda foi ao velório e ao enterro no Cemitério São Salvador, na segunda-feira (6). 

Carismático, apesar de não dar muita abertura, ela lamentou a morte do conhecido que se preparava para celebrar 70 anos. 
Do convívio, recorda-se das conversas. “Ele dizia que se arrependeu e que nunca matou gente boa”.  

Da prisão, pouco falava. Mas chegou a comentar casos, como um motim na antiga Cadeia Pública, no Parque Monte Líbano, (antes da construção do Centro de Detenção Provisória, o CDP, no Taboão) em que  detentos desafetos de um preso, amigo dele, “o senhor João”, foram mortos. Eles perseguiam o amigo do homicida, que se aproveitava de rebeliões, para vingar situações e comportamentos das quais discordava. Naquele dia, ele matou sete. Em entrevistas antigas, recusava o codinome de justiceiro. Durante anos, teve a inscrição “prazer por matar” no corpo.

Zelinda acredita que uma parte dos casos era floreada, exagerada. 

Após três anos de trabalho, o jardineiro aceitou convite para morar com uma das irmãs, em Santa Catarina. Terminava o período em que ele surpreendia os professores quando ficava  emocionado ao receber mimos, como ovos de Páscoa ou regalos no Natal. “Ele virava mesmo uma criança”. Com os estudantes, era atencioso. “Quando havia briga, ele não deixava continuar, dava  conselhos, era respeitado e querido”.  Outros indivíduos que recebiam medidas cautelares, chegaram a ser encaminhados à unidade pela Justiça. “Um deles, que era até aluno, foi num dia e não voltou. A gente conhece quem quer sair da vida errada. E o Pedro queria mudar”, acrescentou. 

A morte dele surpreendeu conhecidos por ocorrer quando estava de “boa, envelhecendo”.   

Seguido por milhares

Nos últimos três anos, Pedro Rodrigues Filho fez carreira de influencer nas redes sociais adotando outro codinome, Pedro Ex-Matador com Jesus ou Pedrinho Ex-Matador, Não Monstro. Lançou duas biografias, divulgava planos para dois filmes sobre a própria história, projetados por Pablo Nascimento, e por Fernando Grostein Andrade (irmão de Luciano Huck) e Fernando Siqueira. Chegou a somar mais de 800 mil visualizações no Youtube – teve, inclusive, “roubo” de domínio nas redes sociais.

Dias antes de morrer, informou aos seus seguidores que estava em Mogi, para resolver um problema pessoal. Ele manteve-se ativo dede o início da pandemia, com comentários sobre crimes, de pregações bíblicas, onde desestimulava criminosos, política, e a importância da vacina da Covid.

Semana passada, gravou encontro com um amigo de infância. Falou da rua mogiana onde viveu desde criança. Dados que podem ter ajudado no plano de morte por vingança ou cobrança, cumprido no ato derradeiro do serial killer.  A Polícia investiga o assassinato e procura três homens que usavam capuz e foram vistos por testemunhas, passando duas vezes pela rua antes dos tiros fatais. O caso foi registrado pelo delegado José Carlos Santos Alvarenga como homicídio com emprego de asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe. 

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