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Reflexões: Pé na areia

Faltou combinar com a filha. Talvez, na expectativa de encontrar uma Disneylândia, o piso escuro e a meia luz do quarto a tivessem assustado

26 de março de 2024

Reflexões | Divulgação

Reportagem de:

A chegada foi empolgante.

Enquanto manobrava pra estacionar, o cenário nos dava as boas-vindas, sem filtros, exatamente como nas fotos.

A piscina, o gramado e o alambrado com um simpático portãozinho aberto, de frente pro mar. Uma pechincha pé na areia.

Mas aos poucos o anfitrião nos levava para os fundos, de costas para aquela pintura de ondas pequenas. A suite era mais simples do que até eu mesmo já esperava.

A simplicidade em troca da proximidade com o mar valeu a pena… Faltou combinar com a filha. Talvez, na expectativa de encontrar uma Disneylândia, o piso escuro e a meia luz do quarto a tivessem assustado.

Por uma junção de fatores, convencemos o anfitrião a melhorar nossa estadia. Finalmente, todos de acordo. Inclusive nossa pequena, recém chegada aos 7 anos, que já se impunha como autoridade na escolha do destino de férias.

Além de outros pontos turísticos, tiramos tempo para curtir aquela pequena faixa de areia em frente ao imóvel, que de difícil acesso era quase deserta e nos parecia uma extensão do quintal.

No último dia, a filha lembrou da avó e comprou uma lembrança. Seguindo minha dica, escreveu um cartão pra deixar “uma frase bonita”. No corredor, antes do acesso à suíte, se sentou no chão, olhou para a parede e começou a escrever no caderninho.

Tinha visto algo, ao qual eu mesmo, embora tivesse passado várias vezes por lá, nunca havia me atentado. Uma decoração que conversou com minhas preocupações.

Recentemente minha rotina se alterou bastante. Óbvio que não gostei e antes de me dar conta, “esperneava” igual criança. Discuti com as pessoas mais próximas de mim por causa das mudanças.

Curioso ver como nós adultos podemos repetir ao longo da vida o mesmo comportamento que vem da infância, revestido de outro formato: em vez do choro literal, a murmuração e amargura diante da frustração.

Mas a filhota, que me revelou um pouco da minha personalidade, sem querer, também apontou o caminho. Depois da reclamação inicial, ela curtiu tanto os dias de sol quanto os passeios possíveis nos dias de chuva.

Agora, sentada ali, olhando pra cima e pra baixo, escrevia seu recado atentamente. Foi quando voltei meus olhos para a parede branca, com um quadro cheio de setas apontando para a auto ajuda no melhor estilo praieiro: “Paz na alma. Amor no coração. Gratidão pela vida. Fé na caminhada”. – Papai, joga fora. Errei.

Salvo um descuido, estava tudo copiado com precisão. Tratei de guardar o papel amassado enquanto a filha começava a escrever um novo cartão sem rasuras pra vovó. Talvez um dia, quando conseguir viver de cor essas frases, eu possa cumprir o que ela me pediu.

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